segunda-feira, 31 de outubro de 2005

Quando a ignorância e o poder são perigosos

"É preciso melhorar. Temos percentagens muito baixas de acusação nos inquéritos. Temos de aumentar o número de processos de inquérito que terminam por acusações e aumentar o número de acusações que terminam por condenações."
(Alberto Costa à revista "Sábado", quando inquirido se há falta de profissionalismo nos inquéritos)


Eu leio a expressão que antecede e só penso que o homem ensandeceu.
O Ministério Público apenas profere acusação nos inquéritos quando entende existir prova suficiente de que determinada pessoa poderá ser condenada em julgamento.
Ora, segundo as palavras do senhor Ministro da Justiça, o número de inquéritos que terminam em acusações têm forçosamente de aumentar porque o mesmo assim o deseja. Pelos vistos, independentemente de se entender existir prova ou não de que determinada pessoa poderá ser condenada na fase de julgamento.
Se o senhor Ministro deseja o aumento do número de acusações, sugiro veementemente ao senhor Ministro que proceda à extinção do corpo de magistrados do Ministério Público e adopte um sistema processual em que o simples exercício da queixa contra uma pessoa certa e conhecida equivalha a uma acusação e conduza directamente à fase do julgamento: poupava-se tempo nas diatribes processuais e desapareciam, de imediato, cerca de duas mil pessoas da folha de pagamentos do Estado (cerca de 1300 magistrados do Ministério Público mais cerca de 800 funcionários).
Dado que o senhor Ministro também deseja que ao aumento de número de acusações corresponda um aumento do número de condenações, mais sugiro que se proceda à extinção do corpo de magistrados judiciais e do respectivo corpo de funcionários, procedendo o senhor guarda ou polícia que receber a queixa à imediata determinação e aplicação da pena que deve incidir sobre o denunciado ou denunciada. Desapareciam, assim, mais cerca de 10 mil pessoas da folha de pagamentos do Estado (cerca de 1.500 juizes e 8.000 funcionários).
Posto isto, o homem é capaz de ter razão. Desapareciam 12 mil pessoas da folha de pagamentos do Estado (belíssima ajuda para a diminuição do défice público, tratando-se dos salários de quem se trata), ficavam-se com imóveis por vender (os tribunais) e a justiça passava a ser célere e desburocratizada.
Além de que a história de Portugal comprova o êxito da existência de uma polícia com as finalidades e os objectivos agora propostos pelo senhor Ministro: chamava-se PIDE e o senhor Ministro orgulha-se no seu curriculum de ter sido preso pela mesma. Realmente nesse tempo as acusações e as condenações eram em número bastante elevado e a maior parte delas nem passavam pelos tribunais.
Pelos vistos, o facto da justiça ser justa não interessa. O que interessa são os objectivos numéricos de acusações e condenações que o senhor Ministro pensa deverem existir.
Confesso que algumas vezes pensei que este homem não percebia nada dos assuntos do Ministério onde se encontrava (este meu pensamento já vem dos tempos em que o dito cujo era Ministro da Administração Interna).
Agora, além de ter a certeza disso, começo também a pensar que, por tal motivo, este homem é perigoso.
Por será que, cada vez mais, este Governo cria-me a vontade de reler o "Triunfo dos Porcos", de Orwell?

P.S. - Depois de ler o post anterior, começo a pensar que só Freud estará em condições de explicar a actual condição mental do Alves.

1 comentário:

Bottled (em português, Botelho) disse...

Caro Senhor Marquês,
Acabo de ler a sua extraordinária crónica e dou-me conta do seguinte: parece que não concorda com a afirmação de um nosso alto dignatário sobre o estado da justiça e o modo como a mesma deverá ser efectuada.
Pois bem, devo dizer-lhe que eu estava presente quando essa pessoa foi entrevistada e acho chocante que não tenham publicado o meu contributo para a dita entrevista (já agora, refira-se que a mesma teve lugar na Taberna do costume, a horas muito impróprias, e com o nosso entrevistado e eu próprio já em condições de cantar a Aldeia da Roupa Branca de trás para a frente ao som do My Way do falecido Sinatra).
Não sejais, pois, muito duro para a criatura! A mente humana, quando sob o efeito de certos líquidos, tende a ficar turva e a esquecer o passado!
Por outro lado, a minha sugestão das execuções sumárias, com a criação dos novíssimos Juízos do Condene Antes e Pergunte Depois (que poderão ser de pequena instância, dependendo do tamanho do arguido), foi bem recebida no círculo político e só não foi avante (afirmação sem qualquer conotação partidária) porque o homem teve necessidade de se ir aliviar e deve ter-se aliviado tão bem que não mais lhe coloquei a vista em cima!
Cá estaremos, então, para os desenvolvimentos futuros, sempre acompanhados da inseparável pinguita, que é o que nos vai ajudando a suportar as agruras desta aldeia.
Hic Hic Hurra