segunda-feira, 10 de setembro de 2007

Involução da Língua Portuguesa

Desde que os americanos se lembraram de começar a chamar "afro-americanos" aos pretos, com vista a acabar com o racismo por via gramatical - isto tem sido um fartote!

Também por cá os "pretos" já nem de "negros" se podem rotular, devendo referir-se a africanos nativos ou destes descendentes como "de cor" - por oposição a esses anémicos "caucasianos", que não podem ser singelamente "brancos".
As criadas dos anos 70 passaram a "empregadas" e preparam-se agora para receber menção de "auxiliares de apoio doméstico". De igual modo, extinguiram-se nas escolas os "contínuos", passando todos a "auxiliares da acção educativa". Os vendedores de medicamentos, inchados de prosápia, tratam-se por "delegados de informação médica". E pelo mesmo processo transmudaram-se os caixeiros-viajantes em "técnicos de vendas". O aborto eufemizou-se em "interrupção voluntária da gravidez". Os gangues étnicos são "grupos de jovens"; os operários fizeram-se de repente "colaboradores"; e as fábricas, essas, vistas de dentro são "unidades produtivas" e vistas da estranja são "centros de decisão nacionais".
O analfabetismo desapareceu da crosta portuguesa, cedendo o passo à
"iliteracia" galopante.
Desapareceram outrossim dos comboios as classes 1ª e 2ª, para não ferir a susceptibilidade social das massas hierarquizadas, mas por imperscrutáveis necessidades de tesouraria continuam a cobrar-se preços distintos nas classes "Conforto" e "Turística".
A Ágata cantava chorosa: «Sou mãe solteira...»; agora, se quiser acompanhar os novos tempos, deve alterar a letra da pungente melodia para «Tenho uma família monoparental...» - eis o novo verso da cançoneta, se quiser fazer jus à modernidade impante.
Aquietadas pela televisão, já se não vêem por aí aos pinotes crianças irrequietas e «terroristas»; diz-se modernamente que têm um "comportamento disfuncional hiperactivo". Do mesmo modo, e para felicidade dos "encarregados de educação", os brilhantes programas escolares extinguiram os alunos cábulas; tais estudantes serão, quando muito, "crianças de desenvolvimento instável".
Ainda há cegos, infelizmente! Mas como a palavra fosse considerada desagradável e até aviltante, quem não vê é considerado "invisual". (O termo é gramaticalmente impróprio, como impróprio seria chamar inauditivos aos surdos - mas o "politicamente correcto" marimba-se para as regras gramaticais...). Ah, e quem não vê bem não é "zarolho" nem "pitosga" e muito menos miope, mas um mais prosáico "amblíope".
Para compor o ramalhete e se darem ares, as gentes cultas da praça desbocam-se em "implementações", "posturas pró-activas", "políticas fracturantes" e outros barbarismos da linguagem.
E assim linguajamos o Português, vagueando perdidos entre a «correcção política» e o novo-riquismo linguístico.
Já agora, as putas passaram a ser "senhoras de alterne".

ESTAMOS LIXADOS COM ESTE "NOVO PORTUGUÊS", não admira que o pessoal tenha cada vez mais esgotamentos e stress, já não se diz o que se pensa, tem de se pensar o que se diz de forma "POLITICAMENTE CORRECTA".

1 comentário:

Ticha disse...

Faria só uma correcção os caixeiros viajantes agora são "gestores comerciais".
A verdade é mesmo essa, já não podemos dizer o que pensamos....