quinta-feira, 26 de abril de 2007

Só para acabar bem o dia

A malta vai gozando.
Mas a verdade é que, não fora o 25 de Abril de 1974 (e embora eu seja da opinião que o mesmo haveria de acontecer, mais tarde ou mais cedo), não tinha existido uma das mais nobres conquistas a que um ser humano, qualquer que o seja, pode aspirar: a liberdade.
Muitos de nós não nos recordamos, nem fazemos por isso (infelizmente), e até chegamos ao cúmulo de nomear o maior português de sempre aquele que, provavelmente, foi o maior tirano de sempre da História Portuguesa.
A verdade, por incrível que possa parecer, é que aqueles tempos sob a égide de Salazar não foram fáceis e, para quem quiser perder um bocado de tempo a questionar os familiares mais idosos, sim aqueles que vocês pensam que são chatos mas que vos podem contar episódios fantásticos de uma juventude perdida, ou, melhor ainda, a ler os livros, que os há (pasme-se) que falam dessa época dourada para a Nação, ou, porque os tempos modernos assim o exigem, a pesquisar na net (vão a um motor de busca e procurem pela ditadura de Salazar, só por Salazar, por Estado Novo, por PIDE, enfim... divirtam-se a puxar pela imaginação) e em breve, estou certo, ficarão horrorizados com as formas de coacção, tortura, manipulação ideológica, política e societária, racismo e violência bárbara, quer física quer psicológica, que eram apanágio daqueles tempos.
Não se passa uma esponja sobre a verdadeira identidade de um povo.
Não se pode, a coberto da cada vez menor propensão à investigação histórica, esquecer os males do passado, ainda para mais tão recente.
Não se deve atirar com poeira para os olhos, sobretudo se esses olhos se limitam a absorvê-la sem questionarem de que lado sopra o vento, de maneira a que possam, por si, proteger-se.
É um facto que o Abril de agora já não tem o impacto do Abril de 74.
É um facto que os políticos de agora, escudados numa democracia que, cada vez mais, desnuda as suas evidentes fragilidades, quando utilizada por quem nenhuns escrúpulos morais tem e se encontra legitimado pela força do voto popular, são seres que têm vindo a perder, infelizmente, a sua credibilidade e de honra já nem a palavra são capazes de ter.
É um facto que muita coisa está errada com Portugal e, à semelhança de outros companheiros de teclas aqui do blog (olá Chefe), eu próprio me interrogo frequentemente sobre a direcção a seguir, sobre a maneira como estamos, nós que já fomos a grande potência mundial no tempo dos Descobrimentos, cada vez mais a ir a pique nos mares da Europa.
Mas é, igualmente, com grande orgulho que me vejo satisfeito por fazer parte de um país onde, entre outras coisas, posso dizer mal do Sócrates à vontade, mal da vida, mal de tudo o que me apetecer, sem fundados receios de que aí venha alguém sacar-me para um qualquer Tarrafal ou, pior ainda, fazer-me desaparecer para sempre, silenciar-me a voz ou parar-me o punho.
Agora estamos numa outra vertente: a das indemnizações por danos morais.
Ou, até, das coimas por fazer humor através de cartazes.
São as possibilidades, infinitas, que a democracia tem de poder fazer valer as suas armas próprias de censura.
Ninguém disse que o universo era perfeito.
Nós próprios não o somos, apesar de feitos à imagem ou semelhança de Deus.
Mas se a censura existe é porque, do outro lado da moeda, há liberdade.
Não me identifico com qualquer força política ou partidária, mas hei-de sempre identificar-me com aqueles que prezam a liberdade.
Se ela não existisse, se calhar, este blog seria clandestino e nós todos andaríamos com o credo na boca.
Porque só quem viveu aquela época de terror sabe bem do que falo.
E eu não a vivi, se calhar nem seria a pessoa ideal para dela falar.
Conheço, contudo, quem a viveu e informei-me o suficiente para saber que não gosto dela, que a abomino e que prezo muito mais os dias actuais, sendo eles como são, onde posso ser maluco à vontade e expressar o que me vai na alma.
Como um dia certo Miguel Ângelo, que não o pintor/escultor, cantou: "Quando alguém nasce, nasce selvagem, não é de ninguém!"
Se esse alguém conseguir manter-se selvagem ao longo da sua vida, insurgindo-se contra todas as formas de repressão à liberdade, seja ela individual ou colectiva, então a sua existência já terá valido a pena.
Ergo o meu copo à liberdade!
Façam o mesmo, companheiros e companheiras!
E sorvam-na lentamente, já que, como todas as coisas boas nesta vida, é assim que ela deve ser saboreada!
Hic Hic Hurra

2 comentários:

Ticha disse...

Engenheiro Zé,

Já dei por mim a pensar muitas vezes em muitos dos factos aqui descritos no facto de termos sido uma potência mundial, que a ditadura um dia acabaria, que tenho muito orgulho em ser tuga e poder dizer o que me vai na alma (quer dizer, nem sempre a Pide voltou e não me larga) hehe

Mas não troco este cantinho à beira mar plantado por nada...

Saudações de Abril!

Inspector Serôdio, José Serôdio disse...

Ó Zé, ganda cadela que tu apanhaste ontem (e não foi a minha)!!!

Depois disto e do post do Chefe, só falta mesmo aparecer o Marquês com a nostalgia daqueles serões pré-revolução no solar, quando todos se engalanavam com folhos, pó de arroz e saiotes, e faziam aquelas marotices atrás do buxo centenário...

Cá pra mim, se começam a descambar para a pornografia sentimentalo-venezuelana, ainda rebenta aqui um golpe de blog!

Snif, snif...