quarta-feira, 25 de janeiro de 2006

A “culpa” de Souto Moura

Começo por escrever que não tenho qualquer tipo de relacionamento pessoal ou de amizade com o Dr. Souto Moura.
Conheci-o pessoalmente no âmbito de conferências em que foi interveniente. Já li alguns dos seus escritos. Privei com pessoas que consigo já trabalharam.
Tal não me confere o direito de escrever qualquer texto sobre a pessoa em apreço.
Todavia, a situação publicamente gerada com o denominado “envelope 9” começa a ser excessiva.
E, quando é assim, penso que todos nós temos o real direito de escrever contra a onda de idiotice que varre, via comunicação social, a opinião pública neste momento.
A imagem que tenho de Souto Moura, e que me é dada pelos seus conhecidos e que se depreende das suas intervenções em conferências e dos seus escritos, é a de que se trata de uma pessoa bastante inteligente, humilde e honesta.
Por outras palavras, se o cargo de Procurador Geral da República fosse um cargo eminentemente jurídico, Souto Moura seria uma das pessoas certas no lugar certo.
Mas o cargo de Procurador é mais do que isso.
É também um cargo eminentemente vocacionado para o jogo político, como depressa se apercebeu, e bem, o antecessor Cunha Rodrigues.
E, nesse jogo, as pessoas humildes e honestas não têm hipóteses de ficarem bem na fotografia; a inteligência jurídica de nada serve.
Apenas a esperteza política e o instinto de sobrevivência prevalecem.
Poder-me-ão responder: mas não reparaste no que aconteceu, na incompetência do homem?
Incompetência, direi eu, só na relação com os media.
Apontem-me um caso sucedido durante o mandado de Souto Moura em que a culpa seja dele. Por ser dele.
Dir-me-ão: ele está no topo, ele é o principal responsável por tudo o que os magistrados do Ministério Público fazem.
Acham? Um Procurador-Geral da República não é um Primeiro-Ministro. Não tem reuniões semanais com os demais ministros. Não sabe o que os outros ministros andam a fazer, por assim dizer.
Existem cerca de 1300 magistrados do Ministério Público em Portugal.
Existem cerca de 3 milhões de processos pendentes nos Tribunais (aqui já se incluíndo os inquéritos), em que o Ministério Público, directa ou indirectamente, tem intervenção.
Será crível que o Procurador possa ser responsabilizado directamente por um erro que um dos 1300 magistrados cometa em 1 dos 3 milhões de processos?
Tanto numa empresa normal, como no Estado, seria o agente do facto o responsável pelo mesmo. Na Procuradoria-Geral da República parece que não. Segundo o entendimento dos nossos políticos e da nossa comunicação social.
E até agora, ao que se viu, ainda não existiu qualquer erro pessoal de monta face ao que tem vindo para a comunicação social.
Tirando as suas irreflectidas declarações para a comunicação social. O que me leva a pensar que umas sessões de aprendizagem com o “marketeer” de Cavaco Silva sobre o relacionamento com os media não lhe faria mal nenhum.
O processo “Casa Pia” tem dado os problemas que tem dado não porque a investigação tenha sido mal conduzida pelo Procurador-Geral da República, mas pelos factores laterais: violação de segredo de justiça pela assessora de imprensa da PGR e pelo Director da PJ; violação de segredo de justiça relativo a escutas em que os altos quadros do PS andaram a exercer pressões um pouco por todo o lado (e mesmo assim foram eleitos de seguida com maioria absoluta, o que na altura me fez levar a pensar qual seria a diferença entre os tempos do salazarismo e os presentes); divulgação de dados do processo por parte dos senhores advogados de defesa aos jornalistas com finalidades pouco claras.
As violações de segredo de justiça devem ser imputáveis ao Procurador nestes casos?
Para o PS e para o pessoal dos media, parece que sim. Para os primeiros percebe-se o motivo da imputação, para os segundos suspeito.
Afinal, de que é culpado o actual Procurador-Geral da República?
De ter despertado a ira do PS ao não sustar a detenção de Paulo Pedroso?
De a PGR só ter dinheiro para efectuar traduções de pedidos de diligências a países terceiros até Maio?
De o DCIAP estar completamente afundado em processos e sem espaço para meter mais uma folha de papel lá dentro, e de não ter meios financeiros para a realização de diligências no âmbito dos grandes crimes económicos?
De não ter uns quantos “compadres” na política e na comunicação social a quem segrede de vez em quando algumas coisitas “giras” e faça as vontades?
Onde está, afinal, a culpa de Souto Moura?

1 comentário:

Anónimo disse...

Mesmo neste pais ninguém é culpado de nada...ou melhor, o culpado é sempre o Zé pagante: esse quando é acusado é que mama com tudo, desde prisão, a escutas, a porrada na esquadra da policia...é uma fartazana e no fim:PAGA!